Cris M. Zanferrari

Cuidar da casa, amar a casa, casar com a casa numa relação que se renova a cada dia, todos os dias.

Sou, definitivamente, uma “homebody”, uma pessoa caseira, em bom português. Minha casa é meu refúgio, espaço sagrado de bem-viver, de poder ser quem se é, de andar descalço, de acender incenso, de sentar no chão, de abraçar o cão e colher afeto. Aqui, café passado é um mantra que se entoa para bem acordar o dia. A alquimia da casa se faz com plantas, bichos e livros. Gente que entre há que ser de bem, há que vir em paz e ir-se mais alargado, de corpo e espírito bem alimentados.

Casa, pra mim, é território seguro, lugar onde medos e angústias são domesticados pelo cheirinho de bolo assando, pelo carinho que emana das pessoas amadas, pelo conforto que vem da biblioteca, morada de amigos sempre disponíveis e doadores dos melhores conselhos. Casa é o meu sem-tempo, habitat das alegrias sem hora, onde o que conta não são os minutos, mas o que se vive, o que se faz e o que se ama. Casa é trégua do mundo, arco-íris depois do temporal, remanso, repasto, rede para abrigar o corpo e música para acalentar a alma.
Estar em casa, abençoar a casa, voltar à casa: verbos conjugados de pijama, moletom velho e um fiel par de pantufas. Lugar de se estar à vontade, de fabricar memórias, de inventar ideias. Casa é lugar-laboratório. Mudamos móveis ou objetos de lugar para experimentar uma nova sensação, testamos uma receita e experimentamos um novo sabor (ou então cozinhamos na tentativa de resgatar algum sabor da infância), impomos rotinas e ritmos à casa, a casa nos devolve os seus. Sim, lugar-laboratório. É em casa que nos experimentamos como verdadeiramente somos e como podemos vir a ser.
Por isso, casa também é território muito íntimo, confessionário de medos e de sonhos, retrato de tudo o que somos, concha que nos guarda e protege.
Por tudo isso, cuidar da casa é cuidar de si. É nutrir-se, fazendo-se cercar do que e de quem importa. É amar-se através dos objetos que contam a nossa história, que nos constituem por identidade e lembrança, enfeitando paredes ou o aparador da sala de estar.
Cuidar da casa é amar-se de uma forma palpável, visível, sensível. É tornar-se, através da casa, reconhecível para nós mesmos e para os outros.
Quem cuida da casa é porque se reconhece nela e aceita, a si mesmo, como se casa fosse: inconstante e imperfeita, porque em permanente movimento e evolução.

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Publicado por:Cris M. Zanferrari

Mestre em Letras, especialista em Filosofia, e especialista em Supervisão Escolar. Atuou como docente na Universidade Luterana do Brasil – ULBRA Carazinho nos cursos de Pedagogia e de Design. Atualmente dedica-se a fomentar e mediar Clubes de Leitura e outras atividades literárias, além de ser gestora da marca Mania de Citação.

7 comentários sobre “A Casa

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